Palavra de especialista
Traumatismo Bucal na infância Publicado: 27 Setembro 2009 | Última Atualização: 19 Setembro 2018

Criança é sinônimo de muita energia e disposição para as mais variadas atividades. Ser criança é querer descobrir o mundo, aprender a andar e explorar os espaços, aprendizado que envolve um alto risco de acidentes, como os traumas que podem afetar a boca e dentes.

“Os traumatismos,  seja em dentes de leite ou permanentes, são considerados uma situação de urgência, no só no que diz respeito aos problemas dentários e conseqüências futuras, mas também pela condição emocional da criança”, avalia Dra. Vivian Farfel (CRO-SP 59.111), especialista em Odontopediatria e em Ortodontia e Ortopedia Facial pela Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo (USP).


O tratamento de urgência dos traumatismos talvez seja aquele que mais exija do dentista bom senso, experiência, habilidade, paciência, acuidade e precisão na obtenção dos dados coletados e na condução do tratamento mais adequado. “O quadro inicial quase sempre é dramático. A boca por ser uma região extremamente vascularizada, sangra e incha com muita facilidade. Normalmente a região fica edemaciada, tudo sangra e não se sabe o que aconteceu Alem disto como agravante, os traumatismos ocorrem mais frequentemente em crianças e jovens, alertando ainda mais para a necessidade de conduzir cada caso com muita atenção.”, observa a especialista.


Todo paciente exposto a um trauma inicialmente deverá ser examinado a fim de verificar seu estado geral de saúde. “Sinais e sintomas como náuseas, vômito, dor de cabeça, sangramento nasal podem indicar a ocorrência de traumatismo craniano. Esse paciente deve ser encaminhado ao serviço médico mais próximo”, alerta Dra. Vivian.

A seguir, Dra. Vivian Farfel responde a outras questões que envolvem este assunto. Confira!

1) Quais os tipos de trauma bucal que existem? Todos envolvem a perda do dente?  

Podemos dividir o traumatismo dental em dois tipos, de acordo com a classificação adotada pela OMS - Organização Mundial de Saúde:
1) traumatismos que acometem os tecidos duros do dente, normalmente causando a fratura de um pedaço do elemento dental. Estes são mais comuns na dentição permanente;
2) traumatismos que acometem os tecidos de suporte ou sustentação do dente. O impacto neste caso rompe as fibras do ligamento que seguram o dente no osso.
De imediato pode ocorrer algo imperceptível em uma observação inicial ou pode ser verificada ligeira mobilidade, sangramento, deslocamento do dente em varias direções e em casos mais graves, perda do dente que sai inteiro do osso por falta de suporte. Estes traumas são mais comuns nos dentes de leite, visto que nas crianças o osso é mais  plástico  e ocorre maior número de deslocamentos do que fraturas.

2) Quem sofre mais traumas bucais, meninas ou meninos? Existe alguma estatística que mostre o sexo e faixa etária?

Quanto à idade, nota-se maior incidência de trauma em crianças de 1 a 2 anos de idade,  quando estão mais expostas a quedas, coincidindo com a fase de aprendizado do andar e falta de consciência do perigo, ausência de coordenação motora e do reflexo de proteção. Nesta fase, o sexo parece não ter influencia na ocorrência do traumatismo.
Na dentição permanente, um aumento de incidência de traumas ocorre entre 6 e 11 anos de idade e nesta faixa etária, a incidência é maior no sexo masculino. Os meninos sofrem duas vezes mais traumatismos na dentição permanente do que as meninas.
Na adolescência, por volta dos 15 anos, a incidência de traumatismos volta a subir e os meninos são novamente mais susceptíveis a traumas, talvez devido a falta de limites e cuidados ou excesso de autoconfiança.

3) Em qual época do ano as crianças estão mais suscetíveis a passarem por algum tipo de trauma bucal?

O período de maior ocorrência é aquele correspondente às férias escolares, quando há aumento da pratica de jogos e esportes.
Já no aspecto de problemas ortodônticos, crianças que apresentam os dentes anteriores inclinados para frente, sem proteção do lábio porque não conseguem fecha-los, respiradores bucais portadores de mordida aberta por hábito de sucção de dedo ou uso prolongado de chupeta, são os principais candidatos ao traumatismo.

4) O trauma bucal costuma deixar alguma seqüela, como manchas e cicatrizes?

Sim. Dependendo da força, do tipo de trauma, da idade da criança e do estágio de desenvolvimento do dente de leite e do dente permanente ocorrem diferentes tipos de seqüelas. Os traumatismos nos dentes de leite podem provocar seqüelas no próprio elemento dental como fraturas, deslocamentos e até perda total do dente, podendo apresentar repercussões como manchas, mudanças de cor do dente, mobilidade, infecção do dente e, até mesmo, necrose da polpa. Estas repercussões devem ser corretamente diagnosticadas com exames radiográficos e clínicos e, se necessário, tratadas.

5) Os traumas no dente de leite podem ocasionar algum problema na dentição permanente?

Devido à proximidade da raiz do dente de leite com o germe dos sucessores permanentes em desenvolvimento, podem ocorrer sérios problemas na dentição permanente, como manchas no dente, alterações de formato, problemas de erupção, malformações, entre outras alterações.

6) Em caso de dente de leite fraturado, qual o melhor tratamento? E no caso do dente permanente?

Atualmente, com a evolução da odontologia estética, já é possível a colagem de um fragmento dentário, técnica com a qual se obtém melhores resultados estéticos em comparação com a utilização de material restaurador. Para obter o sucesso do tratamento, o ideal é localizar o fragmento dental e mantê-lo em uma solução de soro fisiológico ou em leite e o pronto-atendimento.

7) O que pode acontecer quando o trauma afeta o nervo do dente?

Em todos os casos de fratura deve-se, sempre, consultar o dentista para que ele possa avaliar a extensão do dano, tratar a fratura e prevenir problemas que comprometam a vitalidade do dente.

8) E quando há perda total do dente, como recuperar?

É essencial que determinadas condutas sejam adotadas imediatamente, para que se aumentem as chances de salvar o dente. Se o dente for de leite, a colocação deste de volta em seu lugar não é indicada, a probabilidade de sucesso é mínima. Já no caso do dente permanente, o reimplante é o mais indicado. O resultado final de um reimplante depende muito do período que o dente ficar fora do osso e da conservação do mesmo nesse espaço de tempo. O dente deve ser manuseado somente pela coroa. Resíduos devem ser cuidadosamente retirados do dente com soro fisiológico. Não esfregue o dente. Coloque-o de volta no seu lugar, mantendo em posição por pressão com uma gaze ou um pano limpo. Se você não conseguir colocar o dente em sua posição original, mantenha-o em uma solução de soro fisiológico ou em leite ou mesmo embaixo da língua e procure imediatamente um dentista.

9) Um trauma bucal pode afetar a gengiva, mandíbula ou maxilar?

Traumas mais violentos podem incluir a fratura dos ossos que seguram os dentes. Nestes casos, geralmente, o paciente é encaminhado ao hospital e lá é atendido pelo cirurgião bucomaxilofacial.

Perfil

Dra. Vivian Farfel (CRO-SP 59.111)

Especialista em Ortodontia e Ortopedia Facial pela Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo (USP). Especialista em Odontopediatria pela Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo (USP).  Atuação em traumatologia dental infantil junto ao Centro de Pesquisa e Atendimento de Traumatismo em Dentes Decíduos da Disciplina de odontopediatria na USP. É autora de trabalhos científicos publicados em jornais e revistas do segmento, bem como apresentados em congressos nacionais e internacionais.